domingo, 18 de abril de 2010

A subjectividade humana

Existe, no homem, uma subjectividade ou uma consciência que é feita para olhar para o exterior e para compreender o mundo, seja este terrestre ou celeste; e existe uma outra consciência no homem que é feita para olhar para o interior, em direcção ao Absoluto ou ao Si, seja esta visão relativamente separativa ou unitiva. Isto implica que existe no homem uma consciência que é descendente e que obedece à intenção criativa de Deus, e uma outra que é ascendente e que obedece à intenção divina de salvação ou libertação; as duas são incomensuráveis, apesar de existir entre elas uma região onde estas se cruzam e onde dão lugar a uma subjectividade una, e a um equilíbrio existencial entre as duas consciências divergentes; é por esta razão que o homem espiritualmente realizado pode ver Deus em todas as coisas, bem como os protótipos principiais das coisas em Deus. A consciência psíquica e mental compreende as aparências; a consciência intelectual ou cardíaca compreende a Essência; mas a consciência intermédia vê as duas dimensões ao mesmo tempo. Ao ver os fenómenos, ela vê neles Deus, e vê-os em Deus; ela compreende que cada coisa é a manifestação de uma possibilidade divina, em modo analógico ou em modo privativo, e, em simultâneo mas de um outro ponto de vista, ela vê as coisas como que mergulhadas num mesmo clima divino; no primeiro caso, os objectos deixam transparecer a Realidade divina ou os seus modos, enquanto que no segundo caso, a subjectividade participa de modo extintivo e unitivo na Consciência divina.

De qualquer das formas, a subjectividade humana é um prodígio tão espantoso que ela só seria suficiente para provar Deus e a imortalidade da alma: Deus, porque esta subjectividade extraordinariamente ampla e profunda apenas se explica através de um Absoluto que a prefigure substancialmente e que a projecte no acidental; e a imortalidade, porque a qualidade incomparável desta subjectividade não tem qualquer razão suficiente ou motivo proporcional à sua excelência no estreito e efémero ambiente de uma vida terrestre. Se fosse para viver como as formigas, os homens não precisariam das suas possibilidades intelectuais e morais, o que equivale a dizer que eles não teriam necessidade de ser homens; a existência do homem seria assim um luxo simultaneamente inexplicável e inútil. Não o compreender é a mais monstruosa e também a mais misteriosa de todas as cegueiras.

extraído de Frithjof Schuon
L'Ésotérisme comme Principe et comme Voie (Dervy-Livres, 1978)

1 comentário:

  1. Si, querido amigo, "la mas monstruosa y misteriosa de las cegueras". Tantos y tantos "filosofos y pensadores" (¿?) intentando enmarcar lo inmarcable... . Cuando la Sabiduria relampaguea como el rayo y estalla como el trueno, en muy pocas lineas de insuperable belleza, abre los ojos a quienes tengan ojos para ver. Siempre, pero sobre todo en estos ultimos tiempos que corren, menos mal que la ultima palabra de Dios es la Misericordia.
    Con todo mi afecto de corazon para todos los amigos, y mi agradecimiento, tambien como siempre, por vuestro esfuerzo.

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