sexta-feira, 17 de agosto de 2007

Religio Perennis

PARTE II / >> PARTE I

Regressemos às nossas considerações sobre a religio perennis considerada, quer como discernimento metafísico e concentração unificadora, quer como descida do Princípio divino, o qual se torna manifestação por forma a que a manifestação possa regressar ao Principio.

No Cristianismo – segundo Santo Ireneu e outros – Deus “tornou-se homem” por forma a que o homem possa “tornar-se Deus”; na terminologia Hindu poderíamos dizer: Âtmâ tornou-se Mâyâ por forma a que Mâyâ possa tornar-se Âtmâ. No Cristianismo, a contemplação e concentração unificadora consiste em residir no Real manifestado – a “Palavra feita carne” – por forma a que esse Real resida em nós, que somos ilusórios, de acordo com o que Cristo disse na visão concebida a Santa Catarina de Siena: “Eu sou Aquele que é; vós sois aquela que não é.” A alma reside no Real – no reino de Deus que está “dentro de nós” – através de uma permanente oração do coração, tal como é ensinada pela parábola do juiz injusto e a injunção de São Paulo.

No Islão, o mesmo tema fundamental – fundamental devido à sua universalidade – é cristalizado de acordo com uma perspectiva bastante diferente. O discernimento entre o Real e o não-real é afirmado pelo Testemunho da Unidade (a Shahâdah): a concentração correlativa no Símbolo ou a consciência permanente no Real é realizada por este mesmo Testemunho ou pelo Nome divino que o sintetiza e que é, assim, a cristalização quintessêncial da Revelação do Alcorão; este Testemunho ou este Nome é também a quintessência da revelação Abrâmica – através da linhagem de Ismael – e recua até à Revelação primordial do ramo Semita. A “descida” do Real (nazzala, unzila); ele entrou no não‑real ou ilusório, o “perecível” (fânin) [5], ao tornar-se o Alcorão – ou a Shahâdah que o sintetiza, ou o Ism (o “Nome”) que é a sua essência sonora ou gráfica, ou a Dhikr (a “Menção”) que é a sua síntese operativa – por forma a que com esta dádiva divina o ilusório possa regressar ao Real, à “Face (Wajh) do Senhor que só ele aceita” (wa yabqâ Wajhu Rabbika) [6], qualquer que seja a importância metafísica atribuída às ideias de “ilusão” e de “Realidade”. Nesta reciprocidade residem todos os mistérios da “Noite do Destino” (Laylat al-Qadr), a qual é uma “descida”, e a “Noite da Ascensão” (Laylat al-Mi‘râj), que é a sua fase complementar; realização contemplativa – ou “unificação” (tawhîd) – participa nesta ascensão do Profeta através dos degraus do Paraíso. “Em verdade” – diz o Alcorão – “a oração protege contra o pecado maior (fahshâ) e o menor (munkar), mas a menção (dhikr) de Allah é maior” [7].

Mais próximo, de certa forma, da perspectiva Cristã mas, simultâneamente, mais afastada, é a perspectiva Budista, a qual, por um lado, baseia-se na “Palavra feita carne”, mas por outro, não contempla qualquer noção antropomórfica de um Deus criador. No Budismo, os dois termos da alternativa ou do discernimento são o Nirvâna, o Real, e o Samsâra, o ilusório; em última análise, o caminho é a consciência permanente do Nirvâna como Shûnya, o “Vazio”, ou a concentração na manifestação salvífica do Nirvâna, o Buddha, o qual é Shûnyamûrti, “Manifestação do Vazio”.

Em Buddha – especialmente na sua forma de AmitabhaNirvâna torna-se Samsâra para que Samsâra se torne Nirvâna; e se o Nirvâna é o Real e o Samsâra a ilusão, o Buddha é o Real no ilusório, e o Bodhisattva é o ilusório no Real [8], o que sugere o simbolismo do Yin‑Yang. A passagem do ilusório para o Real é descrita no Prajnâpâramitâ-hridaya-sûtra nestes termos: “Foi, foi – foi para a outra margem, atingiu a outra margem, ó Iluminado, que sejas abençoado!”.

***

É da natureza das coisas que todas as perspectivas espirituais tenham que colocar a concepção do homem em contraste com a correspondente concepção de Deus; surgem assim três ideias ou definições: em primeiro lugar a do homem; em segundo, a de Deus tal como Ele se revela a um homem que é definido desta forma e, em terceiro, do homem como determinado e transformado por Deus em resultado da perspectiva em questão.

Do ponto de vista da subjectividade humana, o homem é quem contém e Deus é o contido; do ponto de vista divino – se nos permitimos expressar desta forma – a relação é inversa, estando todas as coisas contidas em Deus e não existindo nada que O possa conter. Dizer que o homem é feito à imagem de Deus significa que, ao mesmo tempo, Deus assume algo dessa imagem a posteriori e em ligação com o homem; Deus é Espírito puro, e o homem é, consequentemente, inteligência ou consciência; por outro lado, se o homem é definido como inteligência, Deus aparece como “Verdade”. Por outras palavras, Deus, ao desejar Se atestar sob o aspecto de “Verdade”, dirige-Se ao homem enquanto capacitado com inteligência, tal como Se dirige ao homem em angústia para atestar a Sua Misericórdia ou para o homem capacitado com livre arbítrio O atestar como Lei salvadora.

As “provas” de Deus e da religião estão no próprio homem: “Conhecendo a sua própria natureza, ele conhece também o Céu”, diz Mencius, de acordo com outras máximas semelhantes. Devemos extrair da nossa própria natureza as chaves que abrem o caminho de subida em direcção à certeza do Divino e da Revelação; falar do “homem” é implicitamente falar de “Deus”; falar do “relativo” é falar do “Absoluto”. A natureza humana em geral e a inteligência humana em particular, não podem ser compreendidas separadas do fenómeno religioso, o qual os caracteriza na forma mais directa e completa possível: capturando a transcendente – não a “psicológica” – natureza do seu humano, capturamos a natureza da revelação, religião, tradição; compreendemos as suas possibilidades, as suas necessidades, a sua verdade. E, ao compreender a religião, não só numa forma particular ou literal, mas na sua essência sem forma, compreendemos também as religiões, ou seja, o significado da sua pluralidade e diversidade; este é o lugar da gnose, ou da religio perennis, onde as antinomias extrínsecas dos dogmas são explicadas e resolvidas.

***

No seu plano exterior e, desta forma, contingente – o qual tem, no entanto, a sua importância na ordem humana – existe concordância entre a religio perennis e a natureza virgem e, pela mesma razão, entre esta e a nudez primordial, a da criação, nascimento, ressurreição, ou o mais alto padre no Sagrado dos Sagrados, um eremita no deserto [9], um sâdhu ou sannyâsin Hindu, um Indío Vermelho numa oração silenciosa numa montanha [10]. A natureza inviolada é, simultaneamente, um vestígio do Paraíso terreno e a prefiguração do Paraíso celeste; os santuários e trajes diferem, mas a natureza virgem e o corpo humano permanecem fiéis à sua unidade inicial. A arte Sagrada, a qual aparenta afastar-se dessa unidade, na realidade, serve simplesmente para restaurar aos fenómenos naturais as suas mensagens divinas, para as quais o homem se tornou insensível; na arte, a perspectiva do amor tende para inundar e exceder, enquanto que a perspectiva da gnose tende para a natureza, a simplicidade e o silêncio; este é o contraste entre a riqueza Gótica e a sobriedade Zen [11]. Mas não devemos perder de vista o facto de que os modelos ou modos exteriores são sempre contingentes e que todas as combinações e todas as compensações são possíveis, especialmente porque, na espiritualidade, todas as possibilidades podem se reflectir nas restantes de acordo com as adequadas modalidades. Uma civilização é integral e saudável na medida em que estiver fundada no “invisível” ou na religião “basilar”, a religio perennis, isto é, na medida em que as suas formas e expressões sejam transparentes para o Não-Formal, mas também – e ainda com mais razão – o pressentimento de uma Beatitude intemporal. Pois a Origem está, simultaneamente, dentro de nós e à nossa frente; o tempo não é mais do que um movimento espiral em torno de um Centro imóvel.
__________________

[5] A palavra fanâ’, por vezes traduzida como “extincão” por analogia com o Sanskrit nirvâna, tem a mesma raiz e significa literalmente “natureza perecível”.

[6] Sûrah “O Misericordioso” [55]:27.

[7] Sûrah “A Aranha” [29]:45.

[8] Ver “Le mystère du Bodhisattva” (Études Traditionnelles, Maio-Junho, Jullho-Augosto, Setembro-Outubro, 1962).

[9] Tal como Maria do Egipto, na qual o não-formal e carácter totalmente interior de um amor por Deus, partilha as qualidades da gnose, de tal forma que se lhe pode chamar “gnose do amor” no sentido de parabhakti.

[10] Simplicidade na roupa e na sua cor, em particular branca, substitui muitas vezes o simbolismo de nudez na arte do traje; em todos os planos, o estado de nudez inspirado pela Verdade nua contrabalança um “culturismo” terreno. Por outro lado, um robe sagrado simboliza a vitória do Espírito sobre a carne, e a sua riqueza hierática – a qual estamos longe de criticar – expressa a profusão inextinguível do Mistério e Glória.

[11] Mas é muito claro que a mais sumptuosa arte sagrada é infinitamente mais próxima da gnose do que a ignorante e simplista dos nossos contemporâneos que professam estar a fazer “uma limpeza”. Só uma simplicidade que seja qualitativa, nobre e conforme com a essência das coisas, pode reflectir e transmitir o perfume da sabedoria não-formal.

quinta-feira, 16 de agosto de 2007

Compreender a palavra “Tradição”

Este curto texto de Ali Lakhani dedicado ao significado da palavra “Tradição”, tal como entendida pelos perenialistas ou tradicionalistas, foi publicado como editorial do nono número da publicação periódica Sacred Web. A tradução deste texto constitui, assim, mais uma contribuição para o objectivo de dar a conhecer o pensamento destes autores, dedicados ao estudo das doutrinas Tradicionais e da Sophia Perennis.

***

A Tradição nada tem a haver com quaisquer “idades”, sejam “negras”,
“primitivas”, ou quaisquer outras. A Tradição representa a doutrina
dos princípios primeiros, os quais são inalteráveis.
Ananda K. Coomaraswamy, Correspondência, 1946


…não existe nem pode existir nada verdadeiramente tradicional que não
contenha em si algum elemento de ordem sobre-humana. Este é, de facto, o ponto essencial, contendo em si a própria definição de tradição
e de tudo o que lhe está relacionado.
René Guénon, O reino da quantidade e os sinais dos tempos


Os termos “tradicional” e “moderno” sugerem uma distinção entre o antigo e o novo, o fixo e o em alteração, o venerado caminho do passado e o progressivo caminho do futuro. A polaridade subjacente que reflecte está fundada na estrutura metafísica da realidade, na arquitectura da Absoluta inviolabilidade da Substância e da Infinita possibilidade da Forma. Esta polaridade subjacente é expressa na dialéctica da Necessidade e Liberdade. A Necessidade é o principio organizador da disposição, da projecção e reintegração: tudo o que existe reside e emerge a partir de uma mesma realidade, cuja Substância transcendental é simultaneamente a sua Origem e o seu Fim, o critério de toda a objectividade. A Liberdade é o princípio criativo desta disposição, expressando-se numa infinita variedade de modos e modalidades da Forma e no imanente potencial da nossa própria subjectividade pessoal.

Os termos “Tradição” e “Modernidade”, tal como usados por tradicionalistas como Seyyed Hossein Nasr, não são derivativos da diferenciação convencional entre os termos “tradicional” e “moderno”, apesar do uso particular que eles dão a estes termos tenha como premissa a estrutura metafísica descrita atrás. Isto pode ser confuso. Para Nasr, “Modernidade” é “aquilo que está separado do Transcendente, dos princípios imutáveis que, na realidade, governam todas as coisas e que são dadas a conhecer ao homem através da revelação no seu sentido mais universal”, enquanto que “Tradição”, por contraste, designa esses mesmos princípios imutáveis, a sophia perennis ou sabedoria primordial, as quais estão fundadas no Transcendente. De acordo com esta definição, Modernidade não é necessariamente um sinónimo de contemporâneo (ou focado no futuro), nem Tradição é sinónimo de continuidade história (ou focado no passado). Tradição é, neste sentido, metahistórica: a sua única relação com o passado reside na ligação de uma particular tradição religiosa à sua fonte original, ou seja, à revelação que a autentica, a escritura que a fundou e as suas formas de adoração, transmitidas através do ambiente protector de uma tradição particular. Mas esta relação entre uma tradição particular e as suas origens históricas é, de certa forma, acidental. A relação entre Tradição e Revelação transcende a história. A Revelação, “no seu sentido mais universal”, não é um acontecimento histórico: está baseada no eterno presente e é contínua. A sua autenticação não pode ser reduzida à nossa capacidade para a colocar em qualquer momento da história, mas sim, garantida pela sua capacidade de ressoar como verdade no interior do santuário do Coração, cuja faculdade de discernimento é o supra-racional Intelecto.

O Conhecimento é, assim, uma ressonância da Substância espiritual que pertence ao todo da criação, e cuja presença ressoa no interior do Coração puro. O Conhecimento não é uma mera forma de taxidermia intelectual, mas sim um caminho para habitar a própria criatura. É ser humano na sua totalidade.

Em linguagem corrente, os termos “tradicional” e “moderno” sugerem duas atitude distintas para com a mudança, o primeiro resistindo-lhe, e o último aceitando-a. Mas a “Tradição”, no sentido de sabedoria primordial, não é necessariamente resistente à mudança. A imagem de Shiva Nataraja personifica, quer a ideia de quietude (o fixo, ou o ser), quer a de movimento (em mudança, ou vir a ser). A “Tradição” é uma combinação de ambos estes elementos. É ao mesmo tempo um Equilíbrio estático e uma Atracção dinâmica, o realismo clássico da transcendência e o idealismo romântico da imanência. O homem é simultaneamente um escravo da mudança (estando sujeito aos processos do tempo) e o seu mestre (estando equipado para a transcender espiritualmente). A busca da salvação é, num determinado nível, uma busca pela paz, enquanto que noutro, uma busca da criatividade e frescura, a libertação da petrificação. O termo “tradicional” pode ter uma implicação pejorativa de excessiva rigidez e formalismo, enquanto que o termo “moderno”, pode querer significar aquilo que é excessivamente individualista ou sem princípios. Nestes sentidos, quer o tradicional quer o moderno são opostos à “Tradição”, a qual reconhece a mútua interdependência dos princípios organizadores e criativos da realidade. Quando a criatividade deixa de se conformar às hierarquias inerentes a um universo ordenado espiritualmente, a volição torna-se satânica e profana a Liberdade. E quando as exigências de conformidade reprimem a expressão genuinamente espiritual, o intelecto torna-se tirânico e profana a Necessidade. A “Tradição” reconhece que a Necessidade (o discernimento intelectual que a expressão criativa tem necessariamente um princípio organizador) e a Liberdade (a transcendência da expressão criativa em conformidade com esse princípio organizador) estão interligados, e que o discernimento intelectual tem implicações morais. O “ethos” humano é assim uma dimensão da estrutura sagrada da realidade.

A “Modernidade”, no sentido considerado pelos tradicionalistas, indica uma tendência para uma “rigidez” moral e intelectualidade “opaca”. Quando a realidade deixa de ser apreendida como metafisicamente “transparente para a transcendência”, não existe nenhuma realidade espiritual apreendida que possa ressoar na alma humana, nada que “derreta” o coração em submissão por compaixão, a verdadeira e serena Liberdade, cuja vil falsificação é uma alma aprisionada pelas paixões, cedendo às gratificações momentâneas de auto-indulgência, antes que os seus insaciáveis apetites sejam desviados para uma nova sedução.

É neste sentido que “Tradição” e “Modernidade” são colocados em oposição. O tradicionalista não é necessariamente oposto ao “moderno” como convencionalmente entendido, apenas à “Modernidade”, entendida como o inverso de “Tradição”, no sentido particular definido anteriormente. Um tradicionalista pode ser “moderno” no modo de vestir, na linguagem, nos confortos modernos ou tecnologias e, ainda assim, necessariamente oposto à “Modernidade”, no sentido da sua negação do transcendente ou do sentido do sagrado. Da mesma forma, nem tudo o que parece “tradicional” está de acordo com a “Tradição”. Por exemplo, o fundamentalismo, apesar de poder surgir revestido de uma roupagem tradicional e usar uma linguagem tradicional, é a própria antítese da “Tradição”, a qual recusa a redução fundamentalista do espírito à palavra, bem como o seu excessivo formalismo e exclusivismo. “Pelos seus frutos conhecê-los-emos”, não pela sua aparência.

As palavras e os rótulos, em ultima análise, tendem a ocultar a realidade, abstraindo-a. Na melhor das hipóteses agem como símbolos, inspirando o significado que reside adormecido no nosso interior. “Tradição” e “Modernidade” são, finalmente, aspectos de nós próprios: “Duo sunt in homine”, ensinado por S. Aquino, um ensinamento que ressoa através do discurso tradicionalista e no interior de cada alma humana. Existe, no fim, um elemento em cada alma que terá de ser conquistado para um bem maior. A “Tradição” convida cada um de nós a cumprir o nosso total potencial humano, a compreender o mundo exterior com o olho interior, com compaixão, e a nos conformarmos com a vontade do intelecto e, dessa forma, ultrapassar as tendências do nosso ser Prometeico, integrando a Verdade, a Bondade e a Beleza nas nossas vidas, por forma a alcançar a Vida Eterna.

sábado, 11 de agosto de 2007

Religio Perennis

Esta publicação é uma tradução de um texto de Frithjof Schuon, intitulado "Religio Perennis", uma das várias designações que o autor atribuía à Sophia Perennis, publicado no seu livro “Light on the Ancient Worlds”.

***

PARTE I / >> PARTE II

Uma das chaves para a compreensão da nossa verdadeira natureza ou destino último é o facto de que as coisas deste mundo nunca são proporcionais ao real alcance da nossa inteligência. A nossa inteligência existe para o Absoluto, caso contrário não seria nada; de todas as inteligências deste mundo, apenas o espírito humano está capacitado para a objectividade, o que implica – ou prova – que apenas o Absoluto confere à nossa inteligência o poder para alcançar em pleno tudo o que pode e ser a totalidade do que é [1]. Se fosse útil ou necessário comprovar o Absoluto, o carácter objectivo e transpessoal do Intelecto humano seria testemunho suficiente, pois este Intelecto é o sinal incontestável de uma primeira Causa puramente espiritual, uma Unidade infinitamente central mas contendo a totalidade das coisas, uma Essência simultaneamente imanente e transcendente. Já foi dito mais do que uma vez que a Verdade total está inscrita num eterno guião na própria substância do nosso espírito; aquilo que as diferentes Revelações fazem é “cristalizar” ou “actualizar”, em diferentes graus e de acordo com cada caso específico, um conjunto de certezas que, não só permanecem para sempre na divina Omnisciência, mas também repousam, por refracção, no “naturalmente sobrenatural” núcleo da individualidade, tal como em cada uma das colectividades étnicas ou históricas, ou na espécie humana como um todo.

Da mesma forma, no caso da vontade, a qual não é mais do que o prolongamento ou complemento da inteligência, os objectivos que normalmente procura atingir, ou aqueles que a vida lhe impõe, não reclamam todo o seu alcance. Apenas a “dimensão divina” pode satisfazer a sede de plenitude na nossa vontade ou no nosso amor. O que torna a nossa vontade humana e, por essa razão, livre, é o facto de que esta é proporcional a Deus; apenas em Deus ela é mantida livre de todas as restrições, de tudo o que limita a sua natureza.

A função essencial da inteligência humana é o discernimento entre o Real e o ilusório ou entre o Permanente e o impermanente, e a função essencial da vontade é a ligação ao Permanente ou ao Real. Este discernimento e esta ligação são a quintessência de toda a espiritualidade; considerados ao seu nível mais elevado ou reduzidos à sua mais pura substância, constituem a universalidade subjacente a cada um dos grandes patrimónios espirituais da humanidade, ou o que pode ser designado por religio perennis [2]; esta é a religião a que os sábios aderem, a que é sempre e necessariamente fundada nos elementos formais da instituição divina [3].

***

O discernimento metafísico é uma “separação” entre Âtmâ e Mâyâ; a concentração contemplativa ou consciência unificadora é, pelo contrário, uma união de Mâyâ e Âtmâ. O discernimento é separativo [4], em relação ao qual se refere a “doutrina”; a concentração é unitiva, em relação à qual se refere o “método”; a “fé” está relacionada com o primeiro elemento, enquanto que o “amor a Deus” se relaciona com o segundo.

Parafraseando o conhecido dito de Santo Ireneu, a religio perennis é fundamentalmente o seguinte: o Real entrou no ilusório de modo a que o ilusório possa regressar ao Real. É este mistério, em conjunto com o discernimento metafísico e a concentração contemplativa que são o seu complemento, o mais importante do ponto de vista da gnose; para os gnósticos – no sentido etimológico e correcto da palavra – em última análise, não existe qualquer outra “religião”. É ao que Ibn Arabi chamou a “religião do Amor”, colocando o ênfase no elemento de “realização”.

A dupla definição de religio perennis – discernimento entre o Real e o ilusório e uma unificadora e permanente concentração no real – implica, adicionalmente, o critério de ortodoxia intrínseca para todas as religiões e espiritualidades; uma religião, por forma a ser ortodoxa, terá de possuir uma mitologia ou simbolismo doutrinal que estabeleça a distinção essencial analisada, providenciando um caminho que garanta, quer a perfeição da concentração, quer a sua continuidade; por outras palavras, uma religião é ortodoxa se providencia a suficiente, senão exaustiva, ideia do absoluto e do relativo e, assim, da suas relações recíprocas, e uma actividade espiritual que é, por natureza, contemplativa e efectiva no que respeita o nosso destino último. De facto, é evidente que as heterodoxias tendem sempre a adulterar ou a ideia do Principio divino ou a forma como nos ligamos a ele; elas oferecem uma mundana e profana, ou – se preferirmos – “humanista” imitação de religião ou de um misticismo que não contém mais do que o ego e as suas ilusões.

***

Pode parecer desproporcional tratar de uma forma simples e, de certa forma, esquemática, um assunto tão complexo como as perspectivas espirituais mas, uma vez que a própria natureza das coisas nos permite considerar o aspecto da simplicidade, a verdade não seria melhor servida seguindo os meandros de uma complexidade não requerida neste caso. A capacidade de análise é uma função da inteligência e a de síntese outra; a corrente associação da inteligência com a dificuldade e da facilidade com a presunção, não tem, obviamente, qualquer relação com a verdadeira natureza do Intelecto. O mesmo acontece com a visão intelectual e a visão óptica: existem coisas que devem ser examinadas em detalhe por forma a serem compreendidas e outras que são melhor observadas a uma certa distância e que, parecendo simples, revelam desta forma, a sua verdadeira natureza. A Verdade pode expandir e diferenciar-se indefinidamente, mas está também contida num “ponto geométrico”; compreender este ponto é tudo, seja qual for o símbolo – ou simbolismo – que provoque a intelecção.

A Verdade é una, e seria inútil recusar procurá-la excepto num local específico, pois o Intelecto contem na sua substância tudo o que é verdadeiro, e a verdade não pode ser manifestada a não ser onde o Intelecto seja utilizado na atmosfera de uma Revelação. O espaço pode ser representado por um circulo, mas também por uma cruz, uma espiral, uma estrela ou um quadrado; e tal como é impossível a existência de uma só figura para representar a natureza do espaço ou extensão, o mesmo se verifica em relação à existência de uma só doutrina para descrever o Absoluto; por outras palavras, acreditar que existe apenas uma verdadeira doutrina é semelhante ao negar a pluralidade das figuras geométricas usadas para indicar as características do espaço ou – escolhendo um exemplo diferente – a pluralidade da consciência individual e de pontos de vista visuais.

Em cada Revelação, Deus diz “Eu”, enquanto Se coloca extrinsecamente num ponto de vista diferente de outras Revelações anteriores surgindo, assim, uma contradição no plano de cristalização formal.

Pode ser feita a objecção de que as várias figuras geométricas não são rigorosamente equivalentes na sua capacidade de servir como correspondências entre o simbolismo gráfico e a extensão espacial e, assim, que a comparação apresentada pode, de igual forma, ser utilizada como um argumento contra a equivalência das perspectivas tradicionais; em relação a isto respondemos que não se pretende que as perspectivas tradicionais sejam correspondências absolutas – pelo menos a priori – com os caminhos de salvação e meios de libertação. Adicionalmente, apesar do círculo – para não mencionar o ponto – constituir uma adequação mais directa da forma ao espaço do que a cruz ou qualquer uma das restantes figuras e, dessa forma, reflectir de uma forma mais perfeita a natureza da extensão, temos que considerar o seguinte: a cruz, o quadrado ou a espiral, expressam explicitamente uma realidade espacial que o círculo ou o ponto expressam apenas implicitamente; as figuras diferenciadas são assim insubstituíveis – doutra forma não existiriam – e não são, de forma alguma, diferentes tipos de círculos imperfeitos; a cruz, por exemplo, é infinitamente mais próxima da perfeição do ponto ou do círculo do que a forma oval ou trapezoidal. Considerações análogas são aplicáveis às doutrinas tradicionais no que respeita às suas diferentes formas e méritos.
__________________

[1] “O céu e a terra não Me (Allah) podem conter, mas o coração do Meu fiel servo contem-Me” (hadîth qudsî). Da mesma forma diz Dante: “Eu entendo que o nosso intelecto nunca esteja satisfeito se a verdade não o ilumina, para além do qual nenhuma verdade é possível” (Paraíso 4:124-26).

[2] Estas palavras relembram a philosophia perennis de Steuchus Eugubin (séc. 16) e os neo-escolásticos; mas a palavra philosophia sugere correctamente ou erradamente uma elaboração mental e não sabedoria e, por essa forma, não traduz exactamente o sentido pretendido. Religio é o que “liga” o homem ao Céu e congrega todo o seu ser; em relação á palavra traditio, esta está relacionada com uma realidade mais exterior e por vezes fragmentada, para além de sugerir uma visão retrospectiva; uma religião recém formada “liga” o homem ao Céu a partir do momento da primeira revelação, mas apenas se torna uma “tradição” – ou tem “tradições” – após duas ou três gerações.

[3] Isto é verdade mesmo no caso dos sábios Árabes pré-Islâmicos, os quais viviam a sua espiritualidade na herança de Abraão e Ismael.

[4] Este é o significado da palavra Árabe “furqân”, nomeadamente, “diferenciação qualitativa”, derivada de “faraqa”, separar, discernir, bifurcar; é sabido que “Furqân” é um dos nomes para o Alcorão.


>> PARTE II

sexta-feira, 10 de agosto de 2007

Frithjof Schuon

Frithjof Schuon, nasceu em 1907 em Basle, na Suiça, filho de pais alemães. Sendo seu pai músico, cresceu num ambiente onde, para além da constante presença da música, prevalecia a arte e literatura, quer do Oriente quer do Ocidente. Vivei em Basle, frequentando a escola da cidade, até à morte do pai em 1920, após a qual se deslocou com a sua mãe para Mulhouse, onde foi forçado a adquirir nacionalidade francesa. Tendo recebido a sua edução inicial em Alemão, era agora exposto ao sistema de educação francês, tendo adquirido conhecimento das duas línguas ainda muito jovem. Com a idade de 16 anos abandonou a escola, dedicando-se ao desenho de tecidos, iniciando-se assim no caminho da arte, a qual era uma sua paixão desde criança, nunca tendo, no entanto, tido qualquer instrução formal.

Ainda em criança, Schuon havia sido atraído pelo Oriente pelas belas canções do Bhagavad-Gita, o qual era um dos seus livros favoritos, assim como as “Mil e uma noites”. Tinha uma propensão natural para a metafísica, tendo-se dedicado à leitura de Platão ainda muito jovem. Ainda em Mulhouse, teve conhecimento das obras de Guénon, as quais serviram como confirmação das suas intuições intelectuais e que lhe vieram a providenciaram o suporte para os princípios metafísicos que tinha começado a descobrir.

Schuon viajou para Paris depois de cumprir serviço militar durante um ano e meio com o exército Francês. Em Paris, para além de continuar o seu antigo trabalho, iniciou o estudo da língua árabe. Em 1932 visitou pela primeira vez a Algéria, marcando a sua primeira experiência com uma civilização tradicional e o seu primeiro contacto com o mundo Islâmico, resultando na obtenção de um conhecimento em primeira mão sobre a tradição Islâmica, incluindo o Sufismo, conhecendo alguns dos seus maiores representantes, tal como o Shaykh al-‘Alawi. Na sua segunda viagem ao Norte de África em 1935, visitou não só a Algéria mas também Marrocos, tendo em 1938 viajado até ao Cairo, onde finalmente se encontrou com René Guénon, com quem se vinha a corresponder há já vários anos.

Em 1939 voltou a parar no Egipto enquanto viajava para a Índia, uma terra que sempre amou e cuja espiritualidade o atraía desde a juventude. Pouco depois da sua chegada à Índia deu-se o início da Segunda Grande Guerra, sendo forçado a regressar a França e a ingressar no exército. Pouco tempo depois foi capturado e preso pelos Alemães. Quando soube que estes planeavam colocá-lo no seu exército devido ao seu passado, fugiu para a Suiça onde acabou por se fixar.

Durante cerca de 40 anos a Suiça foi o seu lar, tendo casado em 1949. Foi aqui que escreveu grande parte das suas obras, tendo sido visitado por diversas personalidades ligadas à religião e pensadores ligados ao Oriente e ao Ocidente.

Em 1959 e 1963, Schuon viajou para os Estados Unidos para visitar as tribos dos Índios Americanos, pelos quais tinha uma profunda admiração e afinidade. Ele e a sua esposa visitaram as reservas Sioux e Crow no Dakota do Sul e Montana, tendo sido aceites pela tribo Sioux.


Bibliografia:
The Transcendent Unity of Religions, 1953
Spiritual Perspectives and Human Facts, 1954
Gnosis: Divine Wisdom, 1959
Language of the Self, 1959;
Stations of Wisdom, 1961
Understanding Islam, 1963
Light on the Ancient Worlds, 1966
In the Tracks of Buddhism, 1968, New Translation, Treasures of Buddhism, 1993
Logic and Transcendence, 1975
Esoterism as Principle and as Way, 1981
Castes and Races, 1959
Sufism: Veil and Quintessence, 1981
From the Divine to the Human, 1982
Christianity/Islam, 1985
Survey of Metaphysics and Esoterism, 1986
In the Face of the Absolute, 1989
The Feathered Sun: Plain Indians in Art & Philosophy, 1990
To Have a Center, 1990
Roots of the Human Condition, 1991
Images of Primordial & Mystic Beauty: Paintings by Frithjof Schuon, 1992
Echoes of Perennial Wisdom, 1992
The Play of Masks, 1992
Road to the Heart, 1995
The Transfiguration of Man, 1995
The Eye of the Heart, 1997

Biografias:

Frithjof Schuon: Life and Teachings - Jean-Baptiste Aymard, Patrick Laude


Mais informação:

Frithjof Schuon

terça-feira, 7 de agosto de 2007

Pray Without Ceasing

Mais um belíssismo livro publicado pela World Wisdom Books. Editado por Patrick Laude, “Pray without Ceasing – The Way of Invocation in World Religions” é uma antologia sobre o caminho da oração invocatória, apresentando pela primeira vez 24 textos basilares das várias grandes religiões e 22 ensaios elaborados por alguns dos mais conceituados autores e autoridades espirituais do nosso tempo.

Esta antologia foi dividida em três partes. A primeira parte inclui excertos retirados dos principais clássicos espirituais que introduzem as fundações do caminho da invocação nas várias tradições. A segunda parte é formada por um conjunto de ensaios escritos por autores contemporâneos que expõem os princípios do caminho da invocação. A última parte é constituída por testemunhos contemporâneos de figuras espirituais de várias religiões que se têm dedicado a esta via espiritual, procurando o editor, ao dar a palavra aos sábios e santos, providenciar ao leitor a oportunidade de sentir a inspiração do caminho da invocação, enquanto sugerindo a relevância, actualidade e acessibilidade desta via espiritual no mundo moderno.

Leitura fundamental para quem quer ir além da compreensão "intelectual" da Sophia Perennis e sentir a sua vibração provocada pela leitura de alguns destes textos que reflectem o mais puro sentido do sagrado.


***


I. FOUNDATIONAL TEXTS

Bhagavad Gita - He who thinks of me constantly
Chaitanya - I shall repeat thy name
Kabir - Recite the name of the Lord
Mirabai - I am fascinated by Thy name
Tulsidas - Comfort in this world and the next
Sukhavativyuha - Glorify the name of the lord Amitabha
Honen - The Buddha of boundless light & taking refuge in the right practice
Shinran - Passages on the pure land way
Zohar - The holy one speaks his name
Abraham Abulafi - A the light of the intellect & the question of prophecy
Rabbi Isaac of Akko - Gazing at the letters & climbing the ladder
Philokalia - St. Philotheos of Sinai, Ilias the Presbyter, St. Symeon the new theologian, & St. Gregory of Sinai
The Way of a Pilgrim - Unceasing interior prayer
The Cloud of Unknowing - Strike down every kind of thought
St. Bernardino of Siena - The sermon for Palm Sunday
St. Jean Eudes - The name admirable above all names
Jean-Pierre de Caussade - The sacrament of the present moment
Ibn ‘Ata’ Allah Al-Iskandari - The key to salvation

II. CONTEMPORARY DOCTRINAL ESSAYS

Frithjof Schuon - Modes of prayer & communion and invocation
Titus Burckhardt - Rites
Martin Lings - The Method
Leo Schaya - The Great Name of God
Marco Pallis - Nembutsu as remembrance
D.T. Suzuki - The Shin teaching of Buddhism
Archimandrite Lev Gillet - On the practical use of the Jesus Prayer
Mir Valiuddin - Some important dhikrs

III. CONTEMPORARY TESTIMONIES

Thomas Yellowtail - Always praying and thinking of god
Sri Ramakrishna - Pray to god with a yearning heart
Swami Ramdas - Constant repetition of the divine name
Mahatma Gandhi - Prayer
Vandana Mataji - Japa-sâdhanâ
Ramana Maharshi - Advaita and Japa
Swami Abhishiktananda (Henri Le Saux) - The prayer of the name
Gojun Shichiri - Sayings on tariki
Gao Xingjian - Namo amitofu
William Johnston - Breathing and rhythm in Christian and Buddhist prayer
Father Lorenzo Sales - The unceasing act of love of Sister Mary Consolata
Shaykh Ahmad Al-‘Alawi - Treatise on the invocation of the divine name
Simone Weil - The love of religious practices

domingo, 5 de agosto de 2007

Crer e conhecer

“É necessário acreditar para compreender, e compreender para acreditar. No entanto, estes não são actos sucessivos, mas actos simultâneos da mente. Por outras palavras, não é possível obter conhecimento de nada que a vontade recuse aceitar, ou amar algo que não seja conhecido.” [Ananda Kentish Coomaraswamy (1887-1947)]

The Essential Sophia

The Essential Sophia, publicado em 2006 pela World Wisdom Books, celebrou os primeiros dez anos de uma das mais importantes publicações periódicas em língua inglesa dedicada aos estudos tradicionais, o Sophia Journal. Este publica artigos baseados na metafísica tradicional, no esoterismo, na filosofia perene e nas cosmologias tradicionais, escritos pelos autores de maior renome na exposição da perspectiva tradicionalista e pelas novas vozes que surgem no meio.

O presente livro é composto por um conjunto de artigos que lidam com os princípios e filosofias nucleares às principais tradições, bem como às suas práticas religiosas, artes, ciências e estruturas sociais.

A sua leitura é essencial para os interessados por estes temas, não só pela importância e qualidade irrepreensível dos artigos que o compõem, mas também pela oportunidade de conhecer alguns autores menos conhecidos.

Para quem acompanha as publicações no Sabedoria Perene já terá lido os pequenos trechos que foram traduzidos e publicados: Tradição e Modernidade e Gnose Cristã. Fica aqui agora a recomendação deste belo livro, editado pelo fundador do Sophia Journal, Seyyed Hossein Nasr.

***


I. Tradition and Tradition
1. Rusmir Mahmutćehajić - With the Other
2. Timothy Scott - Withdrawal, Extinction, and Creation: Christ’s Kenosis in Light of the Judaic Doctrine of Tsimtsum and the Islamic Doctrine of Fana
3. Seyyed Hossein Nasr - The Incantation of the Griffin(Simurgh) and the Cry of the Eagle: Islam and the Native American Tradition
4. Huston Smith - What They Have that We Lack: ATribute to the Native Americans via Joseph Epes Brown
5. Alvin Moore, Jr. - Ut sint unam: Meaning and Goal of the Christian Vocation
6. Jean Borella - The Torn Veil
7. Frithjof Schuon - Christian Gnosis
8. William C. Chittick - Ibn ‘Arabî on the Benefit of Knowledge

II. The Master-Disciple Relationship
9. Huston Smith - The Master-Disciple Relationship
10. Rama P. Coomaraswamy - On Gurus and Spiritual Direction

III.Art
11. René Guénon - The Symbolism of Theatre
12. Seyyed Hossein Nasr - Religious Art, Traditional Art, Sacred Art: Some Reflections and Definitions
13. Patrick Laude - On the Foundations and Norms of Poetry

IV. Science and the Natural Environment
14. Seyyed Hossein Nasr - In the Beginning was Consciousness
15. Seyyed Hossein Nasr - Spirituality and Science: Convergence or Divergence?
16. Wolfgang Smith - Science and Myth
17. Gai Eaton - The Earth’s Complaint

V. Traditionalists
18. Martin Lings - René Guénon
19. Seyyed Hossein Nasr - Schuon and the Islamic Tradition
20. Brian Keeble - Ananda K. Coomaraswamy: Scholar of the Spirit